“O problema é quando você confunde carência com saudade. Quando acha que aquele aperto no peito tem destinatário certo. Quando tenta se convencer de que aquela página virada seria a solução para as suas angústias. Pode ser que não seja nada disso, sabe? Talvez você só tenha tido um dia difícil. Talvez seu chefe estivesse especialmente chato naquela manhã, seu ciclo menstrual não esteja colaborando, sua vizinha tenha comprado o carro dos seus sonhos ou sei lá… Dias complicados acontecem com todos nós. O perigo é quando junto com a tristeza vem a carência. Sim, ela mesma. A responsável por 96% das cagadas do mundo, especialmente quando se apresenta disfarçada de saudade. É quando você lembra daquela pessoa que mora em outra cidade, do rapaz que te deu uns beijinhos e depois desapareceu ou do outrora falecido e por hora ressuscitado ex. É bem nessa hora que a banana come o macaco. É que a malvada da carência tem aquele velho poder de apagar tudo de errado que determinada pessoa fez e ficar martelando os míseros momentos agradáveis. Mas quer saber de uma coisa? Talvez você não precise daquele abraço específico, mas somente de um abraço. Um gesto de carinho, uma conversa amigável, uma dose de afeto, um sexo caprichado. Percebe? Você não precisa dele, você só precisa de alguém. Tudo bem se você é uma moça criada na catequese e que só deu o primeiro beijo brincando de “verdade ou consequência” com 14 anos. Também não precisa sair catando o primeiro que passar na frente da sua casa, muito menos ligar ou mandar aquela mensagem desastrosa para o falecido. Foi justamente pensando na sua situação que alguns gênios inventaram a Nutella, o brigadeiro e o sorvete de flocos. É pensando também em mulheres no seu estado que o cinema de Hollywood já gravou centenas de comédias românticas. É por isso que o Nicholas Sparks e o John Green estão ricos e o tal do Rafael Magalhães não para de ganhar leitoras. Existe um mundo preparado para te abraçar, para te entender e para te acolher sem que faça uma grande merda antes dessa fase passar. A carência é como uma tempestade de verão. Chega sem avisar, faz o maior estrago e quando menos se espera vai embora. Para tamanho dilúvio não existe guarda chuva que dê jeito. O que resta agora é se aconchegar no sofá da sala e esperar as trovoadas passarem. Amanhã é outro dia e logo cedo o Sol há de bater na sua janela. Lave o rosto, prenda os cabelos e saia lá fora para ver o céu. O azul é sempre mais intenso depois de um longo dia de chuva”
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